MATINA
A noite assenta agora a sua eternidade sobre a minha vontade. Quando se perde um amor assim perde-se tudo... Enquanto vai durando o teu desdém, chegam-me à memória outras pessoas assim... A Felicidade, por exemplo, recusou uma vez a poesia e nunca mais a encontrou. Depois, como seria de esperar, pôs-se-lhe a questão do amor: nunca quis saber-lhe o caminho largo e nunca pôde redimir-se. Ambição nunca lhe faltou. Não que fosse egoísta, mas imaginava a vida em batalhas ganhas palmo a palmo, para o que guardava as mãos, não para sensibilidades escusadas e vãs. Era a melhor e a mais disciplinada de todas as mulheres e de tudo saía bem, até dos desgostos, que arrumava em prateleiras protegidas por bambinelas. Vive bem consigo e com os seus barbitúricos. Nunca se despe. Mas, entre as águas do rio, que verdade ainda flutua? Entornei um copo de vinho no sangue e apetece-me dançar durante toda a madrugada.
Por mim, continuo a vestir-me. Sei que, por muito tempo, continuarei a vestir-me. E, vestido, nunca mais serei o mesmo. Hás-de, minha Aurora, uma aurora, sair detrás dos montes e dar a vida e o sinal às flores. Mas em que mundo? Se havia um fio, que eu bem vi, e se partiu e desprendeu e deslizaste, balão fugido antes da festa, para o céu que retomaste… Ah… como está triste o meu coração, enquanto o meu peito se agita de aflição, e enquanto fixo, silencioso, o horizonte!... Além!... Além!... Onde todos os meus desejos se somem!
Tiónio Delmar
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