domingo, 24 de janeiro de 2010

Underground - Ana Oliveira









* underground

rompeu-se o tecto

en/curtaram-se as paredes

e a mão fria que me toca

, não é a minha


Ana Oliveira

Sobrevivência - Maria Manuel Rocha



Escrevo
os rios rubros da lava
vertida em brasa,
imolação tremenda.

os leitos cálidos
a escassez do arado
os cutelos nas raizes.

a voragem das espirais
como espectros cinza
a despenhar caos.

as margens desvalidas
no sorvedouro vasto
das vagas, em tragos.

as fissuras da terra
covas escavadas,
o peso das pedras.

Escrevo
a fuligem das vozes
esquivas à indigência
os gatilhos surdos
como sismos, estilhaços.

A nudez
das casas das hastes
as aves refugiadas
as vidas as campas
os sonhos mudos.

E por dentro da ruína
os rostos de um dia,
olhares em suspensão
ou mãos em despertar
um dia outro, um dia outro.


Maria Manuel Rocha

Sobrevivência - Isabel Rosete



Caminhamos

Pelas areias desertas,

Mas não sabemos onde está o Mundo.


Transpiramos

Por todos os poros,

E não expulsamos as aflições da Vida.


Removemos

Um passado penoso,

Que sempre nos consome o espírito.

Esperamos

A felicidade,

Numa marcha penosa e lenta.


Sonhamos

Com um futuro radioso,

Sem as manchas do infortúnio.


Repelimos

Os gritos desesperados

Dos Povos enclausurados,

E a liberdade não conquistamos.

Lutamos


Em des-união

Pela paz perpétua,

Mas a guerra não aniquilamos.

Sobrevivemos!


Isabel Rosete

Haiti - Orlando Jorge Figueiredo



quero respirar

no meio do betão


o mundo acabou

não tenho água

nem comida


não quero morrer


pouco tempo

de vida

resta-me

olhar esta perna

ferida


não quero morrer


o poema está dentro

de mim

o poema

de sobreviver


não quero morrer


orlando jorge figueiredo

Tema semanal - Sobrevivência



O tema desta semana foi: Sobrevivência.
Nos próximos post podem desfrutar de alguns poemas dos membros do GPA.

Saudações poéticas,

Rita Capucho

quarta-feira, 20 de janeiro de 2010

Só - Ana Oliveira

* só

não me toquem
pois minha pele arde.
envolvo-me em mim
num estado fetal
, sem esperança
ou sorrisos vãos.
tudo ficou inerte
, até o tempo
onde vegeto

Ana Oliveira

domingo, 17 de janeiro de 2010

Solidão - Maria Mamede



SOLIDÃO



...e invento a rosa

a perfumar o quarto

e a madrugada

com lençóis pelo chão

e a luz coada

a dizer que parto

e tu, em meu ouvido

a dizer que não...

...e invento vida

pra nós dois, tolice

e invento beijos

na palma da mão

e invento palavras

que disseste e eu disse

e que bate em nós

um só coração.

...e invento horas

no calor do abraço

e a nostalgia

no tempo vidraça

e invento falares

risos, alegria

nos tristes olhares

da gente que passa!...



Maria Mamede

Solidão - Isabel Rosete

Esperais por mim,
Onde?
Na mais longínqua clareira
De uma floresta
Não iluminada?

Não! Definitivamente, NÃO!
NÃO vos acompanho mais!
NÃO vos desejo mais!
NÃO vos quero mais!

Permaneço só
Enquanto não brotar a Luz
Que ilumine os meus caminhos
Tão íngremes
Como os rochedos do Cáucaso
Onde a Morte e a Ressurreição
Me esperam…

Isabel Rosete

Solidão - Naia Sardo

SOLIDÃO

Na minha casa de campo, em sítio ermo
faço o meu período de afastamento da vida activa
com meditação, recolhimento e oração.

Ela continua a ser o meu refúgio
quando tenho necessidade de isolamento.
Este meu lugar solitário é uma panaceia
para as vicissitudes da vida.

Neste meu retiro, no seu recolhimento e na sua tranquilidade
obtenho a quietação e o sossego para poder discernir
sobre o dia a dia deste pobre e conturbado Mundo-

Naia Sardo

Eco uno - Ana Paula Mabrouk


Eco uno

Guardo de ti o choro nos olhos
E uma mágoa interminável no ser.
Fico perdida no tempo
Chovendo rasgos de memória,
Dilacerando névoas de solidão.
Esforço-me nas lembranças
Mas de riso nem um fiapo.
E descobri, tristemente,
Que não posso deixar morrer em mim
Esta mágoa sentida de ti.
É tudo o que me resta, afinal.
Prefiro morrer aos poucos,
Do que deixá-la morrer singular,
Eco uno do que já foi plural.

Ana Paula Mabrouk